Alguém obteve o telefone do cliente sem o consentimento dele e ainda o oferece algo que ele não quer? Bem, a empresa precisa repensar seu relacionamento com o cliente
– Alô, boa tarde, o senhor Audrey está?
– Alô, boa tarde. Senhorita. Sou eu mesma.
– Ah… Aqui é a Gertrude, da Operadora XYZ e eu tô ligando porque a XYZ está com um plano incrível e uma oferta especial para você nessa semana…
– Certo, é que eu…
– Então, como eu ia dizendo, estamos com um plano ótimo onde você terá 50 zilhões de minutos para falar com celulares da XYZ e 18,5 minutos para conversar com números de telefone fixo para ligações locais durante todo o mês! Fora isso, o plano cobre 5,2 minutos de ligações para qualquer celular e ainda oferece 30,7 SMS para celulares da XYZ ao longo do mês.
– Olha, Gertrude, obrigada, mas…
– E tudo isso por apenas R$30 mensais!
– Agradeço, Gertrude, mas meu consumo mensal é inferior a esse valor, e a internet é mais importante para mim hoje em dia.
– Mas são apenas R$30 por mês e te dá direito a todos esses benefícios!
– Sim, e como eu disse, eu consumo menos que isso por mês. Obrigada.
Eu entendo a Gertrude, de verdade. Sei que para muitos vendedores essa postura comum no telemarketing é algo que não têm como fugir. São as regras do local. Mas é inevitável que eu me sinta incomodada quando essas ligações acontecem assim.
Aposto que você também. Aposto que a própria Gertrude e quem a gerência na operadora XYZ também se incomoda em receber essas ligações.
A questão é: se ninguém gosta disso, por que raios as empresas continuam abordando os clientes dessa forma?
Bem, e se você acha que isso é mais um daquele velho papo sobre telemarketing, esqueça!
O relacionamento com o cliente pode ser invasivo de várias maneiras, e nem sempre elas envolvem abordagem via telemarketing e sequer sempre fazem uso do telefone.
Relacionamentos invasivos com o cliente são aqueles casos em que o cliente é retirado da sua vida comum e fica preso a algo que ele não queria estar: o relacionamento exige mais dele e de sua presença do que ele está, de fato, disposto a oferecer.
A estes casos, podemos classificar que o relacionamento com o cliente é sim invasivo, porque alguém está no território dele sem que ele tenha permitido.
Veja abaixo alguns sinais óbvios para reconhecer quando o relacionamento com o cliente está ocorrendo de forma invasiva:
1) Vendedores não conhecem as personas com quem se correspondem
Primeiro erro: a abordagem é direcionada sem que o vendedor tenha a mínima ideia de seu público-alvo.
Daí ocorrem cenas como aquela acima citada, de se oferecer o produto errado para o cliente – no meu caso, minutos para chamadas, quando uso mais a internet – ou ainda pior.
Um bom relacionamento com o cliente envolve um profundo conhecimento do mesmo e especial cuidado para que a experiência com o bate-papo seja gratificante, resolutiva e não intrusiva.
2) As vendas são direcionadas para clientes de lista de contatos
A empresa comprou uma lista de contatos e deixou seus vendedores contatarem pessoas daquela lista. Desnecessário dizer que uma boa parte daquelas pessoas não gostou nadinha de ser contatada.
Claro que o relacionamento com o cliente é invasivo já que além da situação incômoda de alguém indesejado contatá-lo, ele fica bastante desconfiado daquela empresa que obteve seus dados sem que ele os tivesse fornecido.
3) Os vendedores não fazem venda consultiva
Ele não passa uma ideia de querer ajudar o cliente, mas age quase como um adversário tentando invadir seu terreno.
A impressão que dá é que ele não dá a mínima para o que o cliente necessita e só está seguindo seu velho script de vendas para aumentar o próprio orçamento e o da empresa.
O relacionamento com o cliente é tão invasivo que está amarrado a um único lado a se favorecer dessa relação: o do vendedor e nunca o do cliente.
4) A empresa empurra serviços e produtos para o cliente
Até por não ter feito a tal venda consultiva e não conhecer bem com quem está conversando, os vendedores começam a empurrar produtos e serviços para os clientes.
O pior é que é um produto ou serviço que não interessa em nada o cliente inclusive porque ele não é o público-alvo daquela empresa.
Era o tipo de coisa que uma estratégia definida de público-alvo e outra abordagem resolveria rapidinho.
5) O processo de vendas não se conecta à expectativa do cliente
O cliente tem uma busca e que poderia se conectar muito bem com o que a empresa oferece.
O problema é que a empresa oferece algo distante dessa busca que o cliente tem.
O produto não dialoga com suas necessidades e ele não consegue ver como ele poderia ajudá-lo em seu dia-a-dia. Há uma lacuna a ser suprida em suas necessidades, mas a empresa é incapaz de enxergar e atuar nesse problema.
6) A empresa não se corresponde com o decisor de compra
A lista de contatos que a empresa obteve conversa com pessoas diversas, mas raramente é o decisor de compra.
Por vezes é um colaborador com pouco poder de decidir pela empresa, ou entre famílias, se corresponde com alguém que não tem o controle financeiro da casa.
Todos os benefícios do produto ficam claros, mas para alguém que não poderá pagar por ele por não possuir capital ou controle na gestão.
7) Os vendedores participam de grupos de grupos de networking, mas não possuem uma estratégia definida
Eles querem encontrar boas parceria e firmar bons negócios, mas quando sai de uma reunião de networking o vendedor sente um vazio.
No fim, ele percebe que após longas horas de dedicação não obteve nenhum networking com potencial real de converter.
O problema é tudo ocorreu sem uma estratégia bem definida e ele ficou perdido sobre seu papel no networking, quem estava buscando e como manter essa relação em favor do negócio. Resultado: muitos amigos, zero clientes.
8) Vendedores utilizam e são encorajados a abordarem cliente por meio de “cold call”
Eles abordam o cliente de forma totalmente desconexa.
Espera-se que a relação floresça, mas sem plantar mudas nem sementes para isso. A abordagem é tão intimidadora para o cliente e, ao mesmo tempo, afastada de si que ele não consegue prosseguir muito mais.
Há muita desconfiança dele em relação à pessoa do outro lado da linha e ele quer fugir da conversa até para se proteger – a si e a seu território ameaçados por esse “estranho”.
Todas essas experiências são sim intrusivas.
Quer ver uma coisa? Coloque-se no lugar do cliente. A melhor estratégia para entender se um relacionamento é ou não intrusivo é exercitando a sua empatia em colocar-se no lugar do cliente e perceber como gostaria de ser abordado.
Que tipo de abordagem você mesmo, como cliente, não considera invasiva, mas sim conciliadora, preocupada em melhorar a sua vida e não a “arrancar seu dinheiro” na marra.
É que nos sentimos pressionados por estas abordagens agressivas. E elas agridem tanto que não surtem efeito mais.
Estamos projetados para negá-las porque tudo nos vem de maneira ofensiva: a obtenção de nossos dados, a maneira de entrar em contato, a interrupção do que estávamos fazendo para atender o vendedor, a oferta com foco total no que a empresa tem para oferecer e nunca o que o cliente está buscando.
Uma relação com o cliente não invasiva parte da seguinte pergunta: como esse produto que ofereço pode ajudar esta pessoa com quem estou conversando?
E nunca: como posso fazer com que essa pessoa com quem estou conversando compre meu produto?
A primeira pergunta sabe que deve conversar com as pessoas sem forçá-las a comprar algo que não necessitam. Com isso, o cliente é satisfeito do início ao fim do processo de compra.
Quando a empresa atua na necessidade do cliente ela garante que ele não apenas irá adquirir o produto, mas ficará satisfeito, pois terá seu problema solucionado.
Quando ela se centra apenas na venda, além de afugentar um sem-número de potenciais clientes, a empresa corre o risco de que muitos compradores se arrependam de comprar algo que não necessitavam. Fora que eles podem “pixar” o nome da empresa para muitos amigos depois.
Para um bom relacionamento com o cliente, as empresas precisam ter esse pensamento “empático”, que é uma realidade presente no marketing digital.
Empresas como Google descobriram maneiras de que a publicidade esteja presente quando o cliente quando ele precisa e não quando a empresa o interrompe. Estratégias de Inbound Marketing também atuam nesse sentido com muito sucesso.
O que o Inbound Marketing faz diferente é definir estratégias que acompanhem a jornada de compra a partir da perspectiva do cliente. Ele precisa de mais tempo e conhecer mais sobre o produto?
Então, ótimo! As estratégias irão acompanhar esse tempo do cliente e fornecer ferramentas para que ele mesmo entenda seu problema, os diferenciais do produto e como a empresa poderá solucioná-lo.
O cliente nunca quer comprar algo, o que ele quer é uma experiência (através de um produto ou serviço) que ajude-o a viver melhor. É esse entendimento que deve ser a base de qualquer relacionamento com o cliente.
A empresa e o produto serão importantes depois, mas na abordagem o cliente é o personagem principal. Se for para abordá-lo, portanto, que não seja para interrompê-lo, mas para, através de seu produto, ajudá-lo com um problema que ele vem enfrentando.