Eles vieram do quebra-mar e não usavam sapatos. Não queriam ser os donos do mundo, mas lutavam pelo que era deles, sempre almejando um lugar ao sol. Queriam tudo mudar, queriam só por uma noite falar tudo que elas gostam de escutar. Lançar o papo reto que só os loucos sabem. Eles vieram de Santos, eram o Charlie Brown e conquistaram o Brasil.
Mas como fizeram isso? Como que uma banda que veio da praia, cantando a vida através do skate, surf, sexo e rock’n’roll deu certo? Como conquistou milhões de fãs? Como durou e se reinventou durante 20 anos? Vamos analisar aqui um estudo de case sobre o “marketing” do Charlie Brown Jr..
Quando Alexandre Magno Abrão, o Chorão, conheceu Champignon, Renato Pelado, Marcão e Thiago Castanho em 1992 e resolveram criar uma banda, nascia ali um dos maiores nomes do rock nacional da história. Influenciados por Sublime, 311 e Bad Brains, e com uma mistura de skate, hardcore e reggae, o Charlie Brown Jr. revolucionou um cenário musical que possuía nomes como Raimundos, Planet Hemp, Nação Zumbi, entre outros.
Focando em um público-alvo específico e cantando “tudo que eles gostam de escutar”, a banda despontou em 1997. As letras exprimiam os sentimentos e desejos do jovem brasileiro, desde a conquista da garota amada, da patricinha pelo pobretão, até a revolta com as autoridades e políticos corruptos. A banda entendeu que o jovem é, querendo ou não, um revolucionário sem apoio e que nunca é levado a sério e decidiu explorar esse público.
É bem verdade que a banda teve sua parcela de “sorte”. Em 1997, Chico Science, líder do Nação Zumbi deixava-nos órfãos de sua organizada desorganização. Ainda no mesmo ano, o vocalista Marcelo D2 deixaria o Planet Hemp e focaria na carreira solo. Duas concorrentes estavam fora do páreo e o Charlie Brown Jr. tinha tudo para brilhar. Entenda que bandas como Paralamas do Sucesso, Titãs, Skank já existiam e eram mais conceituadas do que Chorão e sua turma, mas foram os músicos de Santos quem tiveram a competência necessária para dominar o mercado.
Outro ponto que ajudou muito a banda foi ter tido sua música “Tudo Mudar” vinculada na principal novela de jovens que o Brasil teve nos últimos anos, a “Malhação”. De 1997 a 2006 a trilha foi a abertura oficial do programa e fez parte da adolescência de todos os que já assistiram. Malhação foi um fenômeno da juventude de muitos adolescentes que nasceram no final dos anos 80 e começo dos anos 90. Propaganda é a alma do negócio.
Falar do sucesso de Charlie Brown Jr. sem falar de Chorão é impossível. O vocalista foi a alma da banda e o único integrante que permaneceu durante todas as fases. Profissionalmente agressivo e marcado por suas opiniões fortes e desavenças com algumas concorrentes, Chorão soube como usar os seus melhores recursos de forma inteligente e se readaptar as tendências do mercado. Suas letras mudavam sempre que necessário, suavizando-se em tempos mais calmos e revoltando-se quando se era necessário. Era louco, mas um louco consciente. Não era perfeito, mas era original. Não era um chefe, era um líder.
Ao compreender que a trajetória de uma banda assemelha-se ao de uma empresa, já podemos observar diversos elementos administrativos nesse trecho da história do Charlie Brown Jr. Segue alguns exemplos abaixo:
Escolha do Público-Alvo: Foca-se em um público específico e que terá maior tendência a apreciar o trabalho.
Divulgação Correta: A abertura de Malhação fez com que muitos passassem a conhecer a banda.
http://youtu.be/sXUfzAf70wY
Entender o Mercado: O Charlie Brown Jr. percebeu a alta demanda por um som que fugisse dos padrões, e não apenas quando surgiu. A banda se reinventou sempre que precisava mas sem perder a essência original.
Forte Liderança: Todos sabiam que quem mandava ali era Chorão. Apesar de ter lavado muita roupa suja em praça pública (briga com Champignon, por exemplo), o cantor era tido como um ícone para os fãs.
Humanização e Aproximação: A banda sempre conseguiu conquistar seus fãs e isso gerou uma grande aproximação dos consumidores com o produto. A forte interação com o público e a grande participação de Chorão em projetos sociais fez com que o vocalista se tornasse um exemplo de brasileiro para essa geração.
*Em tempo, gostaria de dedicar esse texto em memória de Alexandre Magno Abrão, nosso eterno Chorão. Descanse em paz.
“Só o que é bom dura tempo o bastante para se tornar inesquecível.”